A teoria tática no futebol ainda é uma ciência em desenvolvimento. Há pouca bibliografia, muito conhecimento empírico disseminado de forma imprecisa, e consequentemente discrepâncias entre conceitos utilizados pelos analistas. Parte-se, por exemplo, da premissa que o sistema tático se define sem a posse de bola, como se fosse algo matemático: observar uma equipe defendendo-se é suficiente para identificar se ela está no 4-4-2, no 4-3-3, no 3-5-2…e eu discordo.
Há outros elementos importantes. A posse de bola precisa interferir neste diagnóstico. Como definir o sistema do Barcelona pelo seu posicionamento defensivo – ou posicionamento inicial – se o time joga com posse superior a 70%? Neste caso, o mais importante é o posicionamento inicial dos jogadores do Barça na transição ofensiva, e não na defensiva, porque é a maneira com a qual ele se comporta por mais tempo.
Outro aspecto interessante é a “interação”, termo que ouvi em palestra do treinador Tiago Duarte no curso Kick-Off 5 da escola Perestroika, em Porto Alegre. É preciso identificar com quais jogadores algum específico mais interage. Assim é mais facil definir em qual setor ele tem maior presença, configurando o sistema tático.
É como na “prova real” dos cálculos matemáticos. Parte-se do posicionamento inicial sem a bola para projetar o sistema tático, mas é preciso confrontar esta observação até certo ponto fácil e simples com dados mais complexos: o tempo de posse, o comportamento dos jogadores – espaços ocupados e movimentos realizados – e as interações dos pequenos grupos. Só depois de cruzar estes dados é possível determinar o sistema tático e a estratégia com mais chance de acerto.
Um exemplo disso está no Chelsea, que ontem empatou fora de casa com o Tottenham. Na história recente do clube as equipes distribuem-se no 4-3-3 – foi assim com Mourinho, Ancelotti, e até com Villas-Boas assim que o português chegou a Londres. Mas, aos poucos, pelos jogadores escolhidos, e pelas interações deles, o sistema modificou-se, e o Chelsea tem jogado no 4-5-1 em duas linhas com um volante entre elas (ou 4-1-4-1) conforme o diagrama abaixo:
Sete jogadores têm o mesmo comportamento do 4-3-3 anterior – relembrem aqui. A linha defensiva e o triângulo de base alta bem fechado no centro do campo, com um tripé de volantes passadores, estão intactos. A alteração está nos lados do campo. Antes, com Anelka e Malouda (ou Kalou, ou até Torres) o 4-3-3 configurava-se pelas interações deles, incisivas, na direção de Drogba.
Agora, Mata e Sturridge são wingers, e não atacantes. Não apenas recuam, alinhando-se aos apoiadores Ramires e Raúl Meireles – fato que pode acontecer no 4-3-3 circunstancialmente, com os pontas acompanhando laterais, por exemplo – como também é com esta dupla que eles mais interagem.
Mata e Sturridge jogam distantes de Drogba e deles próprios, interagindo com os meio-campistas e os laterais – o espanhol com Meireles, e com Ashley Cole, e o inglês com Ramires e Bosingwa. Drogba fica ‘divorciado’ deste bloco, sendo requisitado apenas para o pivô e a conclusão, sem participar das tramas. Outro detalhe importante: o Chelsea chegou a ter apenas 35% de controle da bola, passando 65% do tempo, portanto, com posicionamento inicial defensivo, o que torna esta observação mais importante que durante a posse.
Se havia dúvida sobre o sistema tático do Chelsea, aplicar à observação do jogo de ontem a relevância da posse de bola e as interações dos jogadores ajudam a tirar a “prova real”, e definir o 4-1-4-1.
Eduardo Cecconi
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