Quem sabe agora os dinossauristas, aquelas pessoas que se apegam a conceitos arcaicos, defasados e ultrapassados, param de chamar o ‘futebol africano’ de ingênuo, faceiro, desorganizado ou irresponsável. Vimos muitas análises prévias sobre o Mazembe com estas referências, que se mostraram equivocadas. Não há mais espaço para o clichê folclórico na análise do futebol. E o Mazembe mostrou isso nas vitórias sobre o Pachuca e o Inter.
Como já havíamos debatido aqui no blog, o Mazembe joga no 4-5-1 com duas linhas de quatro jogadores e um volante entre elas – ou 4-1-4-1. A estratégia, além do sistema, é extremamente ortodoxa, britânica: linhas agrupadas e próximas, marcação por zona com pressão sobre a bola, transição ofensiva em contra-ataques com os wingers, ligação direta com inversão de lado, concessão da posse de bola ao adversário.
Tudo isso aconteceu contra o Inter. O 4-1-4-1 apresentou um perfeito encaixe ao 4-2-3-1 colorado. Kasongo, o volante central, combatia Tinga assim que o meia-central do Inter recebia a bola. Pelos lados, os laterais Kasusula e Nkulukuta marcavam os extremas D’Alessandro e Rafael Sobis, respectivamente, assim que estes eram acionados. No centro, os meias Ekanga e Bedi bloqueavam as raras passagens de Wilson Matias e Guiñazu. E também pelos lados, os wingers Kabangu e Kaluyutuka acompanhavam respectivamente Kleber e Nei nos apoios dos laterais colorados.
Submetido a um encaixe de marcação perfeito – com disciplina tática, empenho e total cumprimento das atribuições defensivas (os jogadores do Mazembe em nenhum momento desorganizaram o agrupamento e a proximidade destas linhas no 4-1-4-1), o Inter não soube o que fazer. Celso Roth não apresentou nenhuma variação, nenhum movimento diferente, nenhuma alternativa à marcação elaborada pelo Mazembe. O Inter parecia esperar que os africanos errassem, ao invés de induzí-los ao erro, de forçá-los à desorganização.
Roth poderia ter modificado o sistema para o 4-4-2 em losango, por exemplo, puxando Rafael Sobis para dentro, e indefinindo a marcação na área e no centro do meio-campo. Com os lados bloqueados pela marcação dupla do lateral e do winger africanos, o Inter poderia centralizar as jogadas e buscar infiltrações pelo chão – com D’Alessandro, Tinga, Guiñazu, Rafael Sobis e Alecsandro próximos, movimentando-se, tabelando e buscando espaços para infiltrar-se entre as posições de defesa da última linha.
Nas trocas, Roth nada fez para alterar esta submissão ao encaixe. Manteve o 4-2-3-1 mesmo perdendo, mesmo no segundo tempo, mesmo às portas da eliminação. Poderia ter tirado Wilson Matias e Guiñazu, que não tinham mais função, armando um 4-3-3 com dois homens de área (Alecsandro e Leandro Damião), forçando a bola aérea. Mas manteve os dois volantes, tirou Sobis e Tinga – os melhores do Inter até então, apesar dos gols perdidos – e o encaixe de marcação persistiu. Não consegui, ainda, compreender qual a utilidade da permanência de dois volantes até o final, se o Inter precisava virar a partida para chegar à final.
Também faltou mais iniciativa de alguns jogadores. Além da carência de variações táticas e da inexplicável rigidez de conceitos do treinador colorado, não houve iniciativa individual do meio para a frente. A teoria diz que, quando há encaixe de marcação, é preciso o drible, a movimentação, a passagem sobre o seu perseguidor. Se cada colorado era acompanhado por um jogador do Mazembe, vencê-lo obrigaria as linhas a se desestruturar, provocando um efeito dominó de coberturas até que alguém surgisse livre. Mas o Inter preferiu trocar passes de lado a outro, esperando um erro que nunca aconteceu.
Dentro dessa perspectiva, a vitória do Mazembe parece-me justa. Cumpriu todas as premissas do 4-1-4-1 com estratégia defensiva, e na ligação direta com inversão de lado encontrou duas vezes espaços entre Nei e Bolívar. Ao invés de se desorganizar, foi o Mazembe quem desorganizou o Inter e fez os gols da classificação.
Eduardo Cecconi
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